sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Two Men and a Wardrobe

* Two Men and a Wardrobe (1958), de Roman Polanski - uma curta-metragem centrada em que dois amigos carregam consigo um armário por uma cidade, onde damos conta das diferentes percepções da mesma coisa por diferentes pessoas e das suas reacções.


* A navegar encontrei Two Men and a Wardrobe (2008), uma instalação permanente em Sopot/ Polónia, de Paweł Althamer e Jacek Adamas.



(…) Althamer's decision to invite Adamas to participate in the project "Two Men and a Wardrobe" stems partially from the specific context in which the latter operates. A wooden wardrobe abandoned near the Sopot pier is a quotation from the famous 1958 school film study by Roman Polanski featuring two individuals from the margins of society. The sole reason for their alienation seems to be the fact that in their journey through the world they are forced (or want to) carry a grotesque burden. In this sense, the authors of the actual wardrobe can be read as a figure of the other, just like Polanski's film.

However, the cooperation between Althamer and Adamas is not only a self-conscious commentary which revives the truth of the film, but is also a question about the role of sculpture as an object in space – a question which keeps returning in a number of works by Althamer. By treating objects of everyday use, such as bus seats or accessories from a playground as self-sufficient sculptures, Althamer is eager to exchange the material object for a real experience, as it was during last year's edition of Skulptur Projekte Münster, where the audience was confronted with a trodden path which ran across a field. In this context, "Two Men and a Wardrobe" can be understood as an example of "social sculpture" – an object meant for a particular space, whose very definition implies a process of a slow, yet inevitable, change, also in its most literal, physical sense.

Realised by Open Art Project
In the collection of the State Art Gallery in Sopot.



10. Carta a um amigo a.k.a. ponto da situação/ em que pé anda o projecto

Carta a um amigo...sobre o projecto

[Olá. Espero que esteja tudo bem contigo, no amor, no trabalho, no dinheiro e na saúde. Mas adiante, porque não estou a escrever para saber como é que tu estás. Escrevo para te explicar um projecto que ando a desenvolver na faculdade.]


Ora bem. A ideia do projecto seria criar um ser que tivesse a capacidade de se transformar em objectos diferentes (ou incapacidade de ser um objecto de aparência fixa). Este apareceria em diferentes lugares e seria visto por pessoas, que por sua vez questionar-se-iam sobre a sua presença. Ou seja, supostamente tem de ser um objecto que desenquadre com o contexto onde se encontra e/ou que tenha uma presença bastante forte para conseguir chamar a atenção e fazer a pessoa viajar no seu mundo de memórias e de experiências. Tu agora dizias-me: “Pois... crias um ser. As pessoas – sobretudo as crianças - criam seres imaginários para se entreterem, e criam amigos imaginários quando não há ninguém à mão para dois dedos de conversa, e até se multiplicam em vários seres imaginários com diferentes facetas, como Pessoa com os seus heterónimos. Pois sim, estou a ver.” Não, o ser não teria exactamente essa dimensão de amigo imaginário... Pensei nessa hipótese, mas acho mais interessante explorar a reacção das pessoas perante determinadas situações, neste caso em situações em que um objecto está fora de contexto. Ah, esqueci-me de referir que temos um tema para o projecto: a leveza. Este ser teria uma existência leve, o percurso dele teria vários caminhos possíveis, definido pelo utilizador em grande parte. E ao mesmo tempo, teria peso na medida em que provocaria as pessoas pelo seu caractér insólito. Agora penso que não faz muito sentido pensar num ser, mas chamar-lhe coisa. Uma coisa mutável.

Em discussão com o professor da cadeira de metodologia, lembrei-me de uma situação e da minha reacção: Voltava para casa numa tarde de Domingo, e no caminho passei por uma rua de pouco movimento onde deparei-me com um piano já com falta de peças à porta de um prédio. Vinha a caminhar e estava ainda a uns bons atrás quando reparei num objecto ali posto ali no passeio. Só mais perto percebi que era um piano, ou tinha sido um piano. Passei por ele, abrandei, olhei, e continuei. Mas uma curiosidade qualquer fez-me voltar atrás e ficar parada a olhar para o piano que não podia ser tocado. Procurei se havia alguma referência sobre a fábrica, que peças é que restavam do instrumento, acho que ainda lhe toquei, e inevitavelmente lembrei-me de como gosto do som do piano. Agora, ao evocar a situação, recordo-me do gosto e de alguma habilidade do meu pai para tocar piano, da música clássica que ouvia quando era criança, e de várias outras situações em que um piano estava presente. Não consigo lembrar-me é de outra situação semelhante àquela, um piano que já não é piano, ali no passeio. Mais estranho ainda foi tê-lo reencontrado numa outra rua mais próxima de casa quando ia a caminho da estação de metro no dia seguinte de manhã. Desta vez decorado com um papel a avisar “Não tocar”. Até à estação fui a divagar sobre a história daquele objecto enquanto piano, o que o teria matado enquanto piano, sobre a razão de estar ali outra vez ao relento, qual seria o seu destino e se voltaria alguma vez a funcionar como piano. O que um objecto faz pensar em tais cirscuntâncias... Acho que o facto de lhe ter sido retirada a função primária foi o que me despertou mais curiosidade e indignação, aspecto que podia explorar no meu projecto: objectos que perderam a função, colocados em lugares para os quais não foram primariamente pensados; não podermos já dar-lhes uso, nem estarem num lugar em que seria suposto serem usados. Isto pode remeter para o conceito de “lixo”, por isso surgem algumas reticências quanto à perda óbvia de função. Teria de escolher os objectos e os contextos espaciais e sociais de maneira a que não parecessem lixo e terem impacto.

Num pequeno à parte: Com a quantidade de objectos abandonados (postos ao pés dos contentores ou apenas jogados onde calha) que conseguimos encontrar pelas ruas (pelo menos nesta cidade) é possivel recolher o essencial para mobilar uma casa. Basta estarmos atentos a certas zonas, a certas horas da noite. Parece-me uma maneira criativa, ecológica e barata de mobilar, por exemplo, um quarto. Tivesse eu alguém à mão para me ajudar no transporte, e espaço no quarto, já o teria composto com mais um colchão, um sofá e um grande espelho.

Continuarei a carta depois de começar a avançar com o projecto, ou seja, muito em breve.


terça-feira, 28 de outubro de 2008

Unstable Media

Enquanto escrevo dita carta, navego à procura de informação sobre projectos interactivos no âmbito da arte multimédia...

Antimodular (vídeos de utilizador do youtube)

V2 - Instittuite for the Unstable Media


segunda-feira, 27 de outubro de 2008

9. Vou escrever uma carta

Vou escrever uma carta a um amigo.
Na carta vou explicar em que é que consiste o meu projecto.
Hmm...
Hmm... ...

Ainda tenho de escolher um amigo.


domingo, 26 de outubro de 2008

Anarchitekton

Anarchitekton, um projecto de Jordi Colomer.


segunda-feira, 20 de outubro de 2008

8. Às voltas com Odradek

Estranho vídeo de animação sobre seres estranhos encontrado no youtube, baseado no conto Odradek, de Franz Kakfa.





Ou um estranho vídeo sobre um ser esquizofrénico que arranjou um novo amigo imaginário para lhe fazer companhia...


quinta-feira, 16 de outubro de 2008

7. Associação de ideia de projecto com o conto Odradek

* Leitura de conto de Franz Kafka: Odradek "(The Cares of a Family Man") [tradução brasileira]

"I ask myself, to no purpose, what is likely to happen to him? Can he possibly die? Anything that dies has had some kind of aim in life, some kind of activity, which has worn out; but that does not apply to Odradek. (...) the idea that he is likely to survive me I find almost painful." (excerto)


* Associação do mesmo com a ideia de projecto em mente:
- criação de um ser/coisa (x) que se transfigura em objecto, em diferentes contextos/situações/espaços. As pessoas apercebem-se da presença desse objecto, e este fá-las questionarem-se sobre a sua existência enquanto objecto, sobre as memórias que este despolta, e fá-las interrogarem-se a si próprias.

A pensar...
- (x) transforma-se apenas em objectos? poderá transformar-se em pessoas?
- (x) é algo com a aparência de objecto de aparência fixa, que aparece igual em diferentes situações? - ou é algo que muda de aparência na forma de objectos diferentes, consoante a situação? essa mudança é subtil ou radical?
- de que modo interagem as pessoas/animais com (x)?
- que memórias, interrogações, reflexões despoleta (x) nas pessoas?

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terça-feira, 14 de outubro de 2008

6. Ideia de Projecto (síntese)

A ideia para o projecto, prende-se com a exploração do complexo fenómeno do sonho (Chuang-Tzu), vários aspectos da memória, combinando com o conceito de simulacro (Mario Perniola) e as interacções que as pessoas têm entre si e com os objectos e espaços, bem como os sentidos que lhes dão. As pessoas, ao recordarem-se de uma dada situação podem ou não recordar-se dos objectos/espaços/pessoas circundantes. Há objectos/espaços/pessoas que acabam por definir certas situações – esses ficam mais vincados na memória (são decisivos, têm peso); outros que apenas presenciaram ou deram lugar a algum acontecimento – estes já são remetidos para mero cenário (são uma sombra, insignificantes, leves), ou não. Pretendia criar várias situações independentes de vivências – a serem determinadas por quem interagir com o projecto -, nas quais focaria a atenção para um determinado objecto. Esse objecto seria a forma transfigurada de um ser (X). Em todas as situações, (X) apareceria como um objecto/espaço/pessoa pertencendo ao pano de fundo da cena, não decisivo para o momento. No entanto, (X), por breves instantes, faria despoletar na(s) pessoa(s) intervenientes na situação uma lembrança – a ser determinada por quem interagir com o projecto . Essas lembranças poderiam ou não seguir para relatos escritos ou orais de sonhos pessoais ou de outros a entrevistar. (X) percorria assim uma “viagem” entre várias situações/mundos/“planetas” numa espécie de vários sonhos encadeados e cruzados, que se podem quase repetir ou não, simulando-se na forma de objectos/pessoas/espaços que despertam memórias noutras pessoas, em certas situações, que poderão hipoteticamente evocar à reflexão de certos assuntos.


domingo, 12 de outubro de 2008

5. Ideia de Projecto (notas)

- ser que se esquece do nome, do sexo, do passado, em resumo, de quem é: perda de identidade

- no percurso que o utilizador lhe define entre vários mundos (planetas), (x) adquire novas formas (de objectos, palavras, fragmentos)

- cada novo mundo é um planeta diferente e desconhecido

- em cada novo mundo, (x) não tem memória dos mundos anteriores e das vivências neles experimentadas

- o utilizador define também as vivências de (x) em cada mundo/ planeta

- a única memória de (x) acerca dos outros mundos por onde passa é através de sonhos ou de dejá vu

- sonhos e dejá vu aparecem na forma de relatos escritos ou orais de pessoas reais a entrevistar

- ao viajar de um planeta para outro, (x) readquire a forma humana como uma tentativa frustada de se lembrar do que viveu, mas antes de ter tempo para pensar se terá existido alguma coisa antes, se houve um passado, já está a metamorfosear-se numa outra coisa

- só há presente, não há passado nem futuro - que é incerto - mas que pode repetir-se; (x) não tem capacidade de decidir a sua próxima viagem

- (x) pode ser transformado num telefone e ser meio de comunicação entre duas adolescentes que comentam a telenovela da noite anterior; a forma de (x) pode ser mudada para um objecto decorativo esquecido na estante da sala onde se gera uma discussão entre um casal; ou pode adquirir a forma de um painel informativo de uma estação ferroviária que informa os passageiros das chegadas e partidas dos comboios

- a existência de (x) é extremamente leve, pois nesse percurso entre mundos sonhados, imaginados, não é (x) quem toma decisões: é o acaso ou as pessoas e seres que lhes dão uso; mas há inerente um certo peso: o peso das viagens sucessivas, as extuantes metamorfoses a que é sujeito e, apesar de não ter memória, sente a perder-se de sentido

- haverá um fim para isso? (x) não sabe, nem sabe quando ou como foi o iníco, (x) não sabe como interromper a vivência nos mundos por onde passa

- por vezes parece ser várias coisas simultaneamente, ou estar em espaços diferentes ao mesmo tempo, as coisas confundem-se-lhes, são turvas

- (x) não se apercebe de que há mundos tão semelhantes que parecem repetir-se, como num dejá vu.


sábado, 11 de outubro de 2008

4. Korsakow

* Exploração da aplicação Korsakow, que servirá de base na realização do projecto multimédia, baseado na interactividade entre imagens, vídeos e texto.

* Visualização de alguns exemplos de projectos realizados com esta aplicação.


sexta-feira, 10 de outubro de 2008

3. Levantamento de Conceitos

* Autores/ Referências

- Italo Calvino (1923-1985) - “Seis Propostas para o Próximo Milénio” – A Leveza

- Friedrich Nietzcshe (1844-1900) - elabora o conceito filosófico de Eterno Retorno

- Milan Kundera (1929- ) - "A Insustentável Leveza do Ser" (1983) - aborda a ideia de Eterno Retorno de Nietzsche

- Mircea Eliade (1907-1986) - "Cosmos e História: O Mito do Eterno Retorno" (1954) - desenvolve um conceito de Eterno Retorno que se distingue do conceito filosófico.

Eliade cria a distinção entre a humanidade religiosa e não-religiosa, com base na percepção do tempo como heterogéneo, linear e irepetível - uma forma moderna de não-religião da humanidade; e homogéneo, respectivamente. O homem arcaico, ou a humanidade religiosa, em comparação, entende o tempo como heterogéneo, isto é, divide-o em tempo profano (linear), e tempo sagrado (cíclico e re-atualizável). Por meio de mitos e rituais que permitem o acesso a este tempo sagrado, a humanidade religiosa proteje-se contra o 'terror da historia' (uma condição de impotência diante os dados históricos registados no tempo, uma forma de existência aflitiva).


* Levantamento de conceitos
"A Insustentável Leveza do Ser" - 2 opostos


1. Eterno Retorno

. os acontecimentos, as acções, repetir-se-ão vezes infindáveis – possibilidade de aprender com o passado e pensar em diferentes formas de agir perante situações semelhantes


. o mundo é uma realidade única e múltipla, feita de pólos complementares

. o número de factos que podem repetir-se é finito; o tempo é infinito

. “todos os gestos têm o peso de uma insustentável responsabilidade.”

. é “o fardo mais pesado”

. opressão vs. valorização de uma vida

. ”quanto mais próxima a vida está da terra, mais real e verdadeira é.”


ser - realidade - corpo - físico - decisão - responsabilidade - valor - presente - repetição - memória - peso



2. Eterno Retorno, pela negativa

. a vida acontece e não volta a repetir-se - ausência total de fardo – existência insignificante, semelhante a uma sombra, desprovida de peso – o momento vivido não tem qualquer sentido, não tem valor

. “tudo se encontra previamente perdoado e tudo é, portanto, cinicamente permitido.”


esquecer – sonho – alma – insignificância – sombra – passado - irrepetivél – liberdade - leveza


2. Tema: a Leveza; texto de Italo Calvino

Projecto para as cadeiras de Metodologia Projectual Multimédia e Projecto I - Ambientes Interactivos

* Tema: a Leveza
* Texto de partida: "Seis Propostas para o Próximo Milénio" - capítulo "A Leveza", Italo Calvino
* Análise do texto:


. mundo: opacidade, peso, inércia

. conversão do mundo no seu contrário, ou seja, em leveza
>explorar vias, estilos e forma - na literatura, na ciência e na informática

. “As imagens de leveza que procuro não deverão deixar-se dissolver como sonhos pela realidade do presente e do futuro (...)”



> sobre Lucrécio e Ovídio
- o conhecimento do mundo é a dissolução da compacidade do mundo
- a leveza é algo que se cria na escrita, com os meios linguísticos que são os do poeta
- são as qualidades, atributos, formas que definem a diferença entre as coisas (Ovídio)
- paridade essencial em tudo o que existe (Ovídio)
- os átomos são inalteráveis (Lucrécio)




> sobre Cavalcanti
- enumeração de três acepções diferentes para exemplificar a leveza
- “poeta da leveza” – uso do “spirito”, as “dramati personae”
- o peso da matéria dissolve-se (semelhante a Lucrécio)
- “equalização cavalcantiana do real” (semelhante a Ovídio)
- características da sua poesia: 1. leveza; 2. sugerir movimento; 3. ser vector de informação



> sobre Dante
- dá o peso exacto da leveza



. Literatura – duas vocações
1. fazer da linguagem um elemento sem peso (Cavalcanti)
2. comunicar à linguagem o peso, a espessura, a concretização das coisas, corpos, sensações (Dante)


. temos uma ideia de leveza porque também conhecemos o peso

. “A leveza para mim está associada à prcisão e determinação, e não ao vago e abandonado acaso.”



> sobre Cervantes e Shakespeare
- gravidade sem peso (depois de Cavalcanti)
- ligação entre melancolia – a tristeza que se torna leve - e humor – o cómico que perdeu o peso corporal


> sobre Newton e a gravidade – gravitação e levitação



. referências orientais no séc. XVIII: tapetes voadores, cavalos que voam, génios a sairem de lâmpadas



> sobre Leopardi
- discurso sobre o insustentável peso de viver
- a “lua”: sensação de leveza, suspensão, calmo e silencioso encantamento



. “(...) a Literatura como função existencial, a procura da leveza como reacção ao peso de viver.”

. (...) nexo entre a levitação desejada e a privação sofrida.”



> sobre Kafka
- balde vazio = sinal de privação, desejo e procura
- “(...) a cavalo do nosso balde, iremos de encontro do novo milénio, sem ter esperanças de encontrar mais nada nele senão o que somos capazes de levar.”


1. "A Insustentável Leveza do Ser", Milan Kundera

Leitura do livro "A Insustentável Leveza do Ser", Milan Kundera,
em 2003, 2005 e 2008

*Trabalho no âmbito da disciplina Português B - 12º ano (2005)
Texto expositivo – argumentativo: relacionar o título de uma obra literária com a mesma

O título do romance de Milan Kundera, “A Insustentável Leveza do Ser”, prende-se com a ideia da inexistência do eterno retorno em que se encontra fundado o Cristianismo e a própria Europa moderna, perante a qual o autor manifesta sentimentos, ora de conformismo, ora de amargura e revolta.
Ao longo da obra, Kundera aborda o destino do homem e do mundo, apresentando reflexões sobre a existência e a temporalidade, referindo frequentemente o eterno retorno associado a Nietzsche. Segundo esta concepção a energia e a matéria de um universo em fluxo constante são finitas, e os acontecimentos repetem-se um número incontável de vezes no eterno retorno, pelo que todos os gestos possuem o peso de uma insustentável responsabilidade e levava Nietzsche a considerar a ideia do eterno retorno como o fardo mais pesado.
Pelo inverso, na ausênica da consciência do eterno retorno, a vida é leve, insustentavelmente leve, “como poeira ao vento”, vai e não volta, já que se baseia na lineariedade do tempo da doutrina cristã, em que a existência tem princípio, meio e fim e, por isso, tudo o que acontece nesta vida, bom ou mal, não se repetirá.
Assim, a II Guerra, por exemplo, e as suas consequências devastadoras, tal como são retratadas no livro por meio de personagens históricas e fictícias que movem num tempo antes e depois da guerra, tendo sobretudo como pano de fundo a República Checa, não conhecerão retorno, caminham já para o esquecimento.
Com a Insustentável Leveza do Ser, Milan Kundera relembra a história e a vida dos que construíram a história, ao homem do presente e do futuro, cuja vida é “terrivelmente leve” e não passa de “um esquisso sem quadro”.



* Extractos do livro "A Insustentável Leveza do Ser"

"O mito do eterno retorno diz-nos, pela negativa, que esta vida, que há-de desaparecer de uma vez por todas para nunca mais voltar, é semelhante a uma sombra, é desprovida de peso, (...)"p.11

"Se cada segundo da nossa vida tiver de se repetir um número infinito de vezes, ficamos pregados à eternidade como Jesus Cristo à cruz." p.13

"Tomas repete em silêncio o provérbio alemão, einmal ist keinmal, uma vez não conta, uma vez é nunca. Não poder viver senão uma vida é pura e simplesmente não viver." p.17

"É natural que quem quer elevar-se sempre mais, um dia, acabe por ter vertigens. O que são vertigens? Medo de cair? Mas então porque é que temos vertigens num miradouro protegido com um parapeito? As vertigens não são o medo de cair. É a voz do vazio por debaixo de nós que nos enfeitiça e atrai, o desejo de cair do qual, logo a seguir, nos protegemos com pavor." p.75

“(...) suponhamos que havia no universo um planeta onde pudéssemos vir ao mundo pela segunda vez. Ao mesmo tempo, embrar-nos-iamos perfeitamente da vida passada na Terra, de toda a experiência já adquirida.
E talvez houvesse outro planeta onde viéssemos à luz pela terceira vez com a experiência das duas vidas anteriores.
E talvez fosse havendo sempre mais planetas onde a espécie humana fosse renascendo sempre um grau mais acima na escala da maturidade.
Era assim que Tomas via o eterno retorno.” p.254

“É uma palavra alemã que apareceu em meados do século XIX sentimental e que depois se vulgarizou em todas as línguas. Mas a sua utilização frequente fê-la perder todo o valor metafísico original: o kitsch é, por essência, a negação absoluta da merda; tanto no sentido literal como no sentido figurado, o kitsch exclui do seu campo de visão tudo o que a existência humana tem de essencialmente inaceitável.” pp.281/2
“A interrogação é como faca que rasga a tela do cenário para permitir que se veja o que está atrás.” p.289


Aqui arrumo